terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

# NEM ME CONTEM

                                                                                                           
                                           
Houve um tempo em que traição era crime, e quem traía perdia o direito até aos filhos, e nesses tempos remotos a traição se chamava adultério. As coisas mudaram, mas eu acho que a traição continua sendo crime - e hediondo.
Devo ter sido traída várias vezes - afinal, quem não foi? -, mas dei a sorte de nunca ter tido a certeza. Porém, sofri tanto só de desconfiar que não desejo isso nem para minha pior inimiga. Que mentira: para ela eu desejo, sim. Ainda mais se ela for aquela grande amiga que, eu supeitava, estava tendo um caso com meu marido.
Traição de homem a gente tira de letra, sempre se soube que a raça masculina não resiste a uma coxa durinha, bem queimadinha de sol. Eles são infantis e nunca vão mudar. Mas essas coisas a gente perdoa, pois é tão bom quando ele nos cobre de beijos e diz que é tudo imaginação, que somos loucas. Mesmo que seja tudo mentira, é tão delicioso escutar essas declarações de amor que a gente acredita. Mas existe uma traição difícil de engolir: é a traição pública, aquela que todo mundo fica sabendo. Aí é difícil perdoar, e, mais ainda, esquecer. É quando me vem à cabeça o affair Clinton.
Os primeiros tempos devem ter sido horríveis, mas, como não dava mesmo para negar, eles decidiram ficar juntos. O.k. Tinha a política, Hillary queria ser eleita senadora e conseguiu. Imagino que nos primeiros dias eles tenham ficado a maior parte do tempo calados; falar de quê? Mas as coisas foram se acalmando e uma bela noite ele deve ter tentado uma transa. Os homens sempre acham que uma boa transa apaga todos os erros cometidos (por eles). E é isso que me põe curiosa: será que, quando ela olhou nos olhos dele, bem de perto, não pensou, automaticamente, em Monica Lewinsky? E aí, será que deu para ir em frente?
Houve um tempo em que os homens negavam tudo. Pela minha alma", eles diziam, ou "pela alma de minha mãe", pobre mãe. Depois veio a onda do modernismo, em que as mulheres até compreendiam uma traição, mas eles tinham que contar: era a época da sinceridade acima de tudo. Pois eu espero que o homem que me trair tenha a delicadeza de negar sempre. Não me interessa que ele seja sincero e verdadeiro; quero achar que ele nunca me traiu, e para isso ele pode (e deve) mentir descaradamente, dizer que estou pirada, que caia um raio em sua cabeça se estiver mentindo. Como nenhum raio vai cair mesmo, ele pode falar à vontade; eu vou acreditar em tudo e ficar bem feliz.
Um dia eu li num jornal que um casal francês bem idoso estava sentado num banco do jardim de Luxembourg, em Paris, conversando, quando ela perguntou se ele tinha ou não tido um caso com uma tal fulana, 50 anos atrás. Afinal, tanto tempo já havia passado, ele podia dizer. O marido confessou, e a velhinha deu-lhe uma dentada na orelha tão violenta que ele foi parar no hospital.
Trair, ainda vai, mas confessar, jamais.

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